Diz-nos o Francisco que "Todavia, creio que o investimento educativo nos cidadãos pelo Estado é um dever(...) Pôr em causa esse dever é, a meu vêr, pôr em causa o Estado" (adaptação minha, creio que não faz falta as partes que eu cortei, e mesmo assim o texto do Francisco encontra-se mesmo aqui perto). Depois disso, considera isto algo incompreensivel aos ditos liberais, porque este parecer seria o de "um Estado presente, solidário e promotor de um desenvolvimento sustentado e em plena igualdade de oportunidades para todos." (mais uma vez, adaptação minha, sem prejudicar integralmente o texto).Ora, eu penso que não há nada nas políticas liberais que ponha em causa esse dever de estado, aliás, os liberais são pródigos em aceitar deveres do Estado, é complicado é quando lhes vêm falar de Direitos do Estado oponentes aos Direitos do Cidadão.
De facto, numa sociedade moderna, não faz sentido idealizar um sistema de ensino que não seja gratuito, ou tendencialmente gratuito, dependendo das infra-estruturas e meios dos Estados. A verdade é que esta mentalidade não tem exclusivismos de Esquerda, não é sequer uma exclusividade deste século. Um liberal considera que, de forma a que cada cidadão possa ser livre, deve ter acesso a uma educação completa, suficientemente enriquecedora para o formar, enquanto animal político e social, nas gastas palavras do Grego.
Melhor, um liberal acredita, faz questão, que um cidadão possa ter acesso a uma educação sem restringimentos económicos, e ainda que tenha a liberdade de escolher onde a quer! Mais importante do talvez ter acesso a ela, o cidadão deve poder escolher educar-se como e onde quer, e o Estado assegura-lhe assim um Direito Fundamental(que não o é na nossa constituição, mas que está de certa forma implícito como tal). Para esta questão ler o "Estudo de Direitos Fundamentais" do Gomes Canotilho, na parte dos direitos sociais e económicos.
Daí tem o liberal que aceitar que os meios do Estado não são ilimitados(pelo menos na maioria dos Estados, em Portugal desde 1974 os recursos assim o são). Ora nesse caso, há que apostar numa certa descentralização e democratização do ensino. Há que colaborar com as escolas privadas, que mesmo não sendo organismos públicos, funcionam em prole de um interesse comunitário, exemplo das escola privadas católicas, que fornecem um ensino religioso a todos os que estiverem interessados a aliar o seu ensino ou dos seus filhos à prática da religião, e eu excluo deste exemplo as que se remetem à prática exclusiva da religião, porque seminários e bar mitzvahs podem muito bem pagar-se a si mesmos.. Isto tudo vai no interesse máximo de uma das normas constitucionais mais bonitas da nossa constituição, essa mulher que nunca pára de me impressionar à medida que a vou conhecendo, sendo essa norma a seguinte:
Artigo 43.º
Liberdade de aprender e ensinar
1. É garantida a liberdade de aprender e ensinar.
2. O Estado não pode programar a educação e a cultura segundo quaisquer directrizes filosóficas, estéticas, políticas, ideológicas ou religiosas.
3. O ensino público não será confessional.
4. É garantido o direito de criação de escolas particulares e cooperativas.
Ora, isto é lindo. Isto é mesmo muito bonito, principalmente aquele segundo artigozinho, que está mesmo a calhar. Isto é uma medida de influência liberal, é um travão aos condicionalismos de ensino que alguns partidos ditos democráticos queriam criar no pós-25 de Abril, para contrapor aos condicionalismos do ensino da era anterior.De facto, o dever do Estado é, pura e simplesmente, assegurar o acesso de todos a uma educação livremente escolhida, independente de condição económica ou geográfica.
Ora isto, meus senhores,só isto, meus caros cavalheiros e senhoras, custa muito dinheiro.
Daí o liberal afirmar que o Estado deve incentivar à concorrência entre estabelecimentos de ensino superior e de 3º ciclo, num objectivo de fornecer ao aluno um vasto leque de escolha de estabelecimentos de ensino com disciplinas que lhe interessem, e assim desenvolver e especializar certos focos de cultura e tecnologia.
A verdade é que as escolas precisam de mais autonomia, precisam de mais contacto com as comunidades, precisam de uma abordagem realista para com o mercado de trabalho. Queria focar-me em duas alíneas do artigo 74º, anteriormente previsto pelo Francisco Noronha:
e) Estabelecer progressivamente a gratuitidade de todos os graus de ensino;
f) Inserir as escolas nas comunidades que servem e estabelecer a interligação do ensino e das actividades económicas, sociais e culturais;
Muitos liberais conservadores acusam o carácter extremamente programista da nossa constituição, no entanto neste ponto tal não pode ser observado.
Tudo o que aqui se prevê é a simples regulação estadual no que toca à adaptabilidade das escolas no seu meio, na f), e na e) prevê-se a progressiva gratuitidade.
Estes pontos foram abordados, recentemente, pela Direita portuguesa, num projecto-lei apresentado pelo CDS, para que houvesse mais facilidade aos pais para escolher o sítio onde os filhos estudassem, muitas vezes tratando-se de escolas privadas por razões de proximidade!
Um liberal não vê o ensino comparticipado pelo Estado como necessariamente público. O Cidadão tem tanto direito a aprender como a ensinar. E tem tanto direito a ensinar, como a aprender aquilo que ele quer.