domingo, 15 de junho de 2008

anos-luz

Noruega aprova casamento e adopção de crianças por casais homossexuais.

Quando penso que nós por cá ainda há tão pouco tempo fizemos o referendo sobre a IVG; quando certos grupos de pessoas o continuam a contestar de uma forma ridícula e ignorante; quando o casamento homossexual continua a ser um não-assunto político (já para não falar da adopção por casais gays); quando os grupos LGTB continuam a ser alvo das mais repugnantes perseguições; quando... Chego à melancólica conclusão da nossa exemplar pequenez, tacanhez e do nosso muy nobre conservadorismo bacoco e retrógado. Na era do falso dogma do super "desenvolvimento", o impensável é paradoxalmente uma certeza absoluta: a sociedade humana, passados milhões de anos, ainda está atrasada como o caralho.
Se a democracia foi a maior conquista política da Humanidade, então isto não é democracia.

16 comentários:

ASL disse...

Francisco,

De facto, não podia estar mais de acordo contigo quando dizes que "Na era do falso dogma do super "desenvolvimento", o impensável é paradoxalmente uma certeza absoluta", e, acrescento: como é possível termos grandes pólos de desenvolvimento tecnológico, científico e financeiro, e termos, por outro lado, focos imensos de pobreza e de insipiente conhecimento?

Que coerência está numa sociedade que se faz por ser cada vez mais desenvolta tecnologicamente, prestigiante economicamente e justa social e financeiramente, e depois tem uma outra, completamente díspar, no mesmo planeta, a umas "escassas" milhas? Estamos, de facto, muito atrasados... Há coisas muito graves aqui a falhar (o que daria para mais do que um simples post).

Agora, Francisco, num clima de saudável discussão e debate como me parece que se pretende manter neste blogue, queria perguntar-te (e a todos aqueles que partilham da tua opinião nesta matéria): em que medida é que a adopção por casais homossexuais é sinal do dito e desejado "super desenvolvimento"? Como é que a impossibilidade da adopção por gays é símbolo de atraso?


P.S.: Devo dizer que estou particularmente curioso pela tua resposta na medida em que suponho que vás considerar que isto não é uma questão que se reduza ao casal homossexual.

D. disse...

muito simples. igualdade entre os seres humanos = desenvolvimento a todos os níveis. uma sociedade desenvolvida não pode ser racista ou xenófoba, logo, tal como é absurdo para nós impossibilitar que um casal de raça negra se case ou adopte filhos, é claro que é absurdo e retrógrado, defender que os homossexuais não possam casar ou adoptar crianças. parece-me bastante óbvio.

Nelson Rocha disse...

não costumo comentar somente para dizer "amén". Mas de facto digo-te "/agree Daniela".

Sem dúvida.

Cumprimentos.

P.s. Bom post Noronha. O "discurso" está mesmo agressivo. No bom sentido. Sente-se o que tu sentes; passe a redundância.

ASL disse...

Parece-me um tanto estranho querer dizer que, quando se entrega uma criança a uma família, ser filho de uma pai e de uma mãe africanos, para a criança, é o mesmo que ser filho de um pai e de um pai ou de uma mãe e de uma mãe!

É lógico que não faria sentido criar critérios de raça para adoptar crianças porque não é por ser preto ou branco que o crescimento da criança vai ser diferente.

Agora, porquê querer tratar por igual o que não é igual (no que diz respeito à paternidade)? Entendem que para uma criança é indiferente ter dois pais ou ter duas mães? Nem sequer estou a falar daquilo a que muita gente se refere como sendo "incómodo" ou uma situação "embaraçosa" para a criança ao chegar à escola e dizer que tem dois pais ou duas mães! A questão não é a imagem!

Há alguém neste mundo que admita que se pode criar a situação de não se ter um pai ou uma mãe POR OPÇÃO? Será que já não são suficientes as situações em que uma pessoa perde o pai ou a mãe?

Há alguém que entenda que é indiferente que para o crescimento de um ser humano os pais serem de sexos diferentes?

Igualdade não significa padronizar! Igualdade significa tratar por igual o que é igual e tratar por diferente o que é diferente! Tomar um casal homossexual como igual a um heterossexual, no que diz respeito à paternidade, é uma igualdade barata! Daí, talvez, se tomar este assunto como "muito simples" e "bastante óbvio"...


P.S.: Pelos vistos a curiosidade que tinha pela resposta não se justificava, uma vez que esta foi dada focando meramente o casal homossexual, como se apenas de uma união de facto se falasse, e não tendo abordado a personagem-chave da adopção: a criança!

Francisco disse...

ASL,

eu ainda não dei a minha resposta!
Mais logo dar-te-ei.

Um abraço

Anónimo disse...

só não percebo o que tem a ver democracia os casais homossexuais poderem adoptar crianças...a mim parece-me uma opção política, não um qualquer requisito para estarmos perante um regime democrático.

Francisco disse...

Engraçado, sempre achei que o conceito de democracia tinha inexoravelmente como requisito a igualdade de direitos para todos. Ou será que a adopção de crianças não é um direito?
Que ingénuo que sou.

Francisco disse...

Ah, esqueci-me da "opção política". Claro. A concessão do direito de sufrágio às mulheres foi uma opção política; a concessão de sufrágio aos negros foi uma opção política; no limite, nesta linha de raciocínio, tudo é uma opção política.
Esse teu argumento, Tiago, é muito perigoso.

Nelson Rocha disse...

Como João Baptista Machado refere:

« (...) certas formas de conduta que se tida "normais" e rejeitar e reprimir outras consideradas "anormais" do ponto vista biológico: são-no apenas do ponto vista cultural (moral) e social, de acordo com um sistema de valores adoptado pela sociedade. Que haveria de mais natural (e até saudável, talvez) do que sair nu em dia de canícula?»

Não está aqui sistematizada as questão do casamento de homossexuais e adopção? Afinal o conceito do "normal" é o melhor amigo do conservador "bacoco".

Francisco disse...

Os melhores amigos, sem dúvida.

ASL, ainda não me esqueci de ti! Mas dado que te quero responder com alguma substância, preciso de tempo e disponibilidade para o fazer.

D. disse...

não vejo em que é que um casal homossexual seja diferente de um heterossexual. aliás, acho que seria bem melhor para uma criança crescer com dois pais ou duas mães ou seja lá como o queiram entender, do que sem pai nem mãe nem mães nem pais, em instituições onde ninguém assume a figura paternal, deixando-as ao abandono, por vezes sofrendo de abusos sexuais.
não vejo onde seja diferente. acho que a função dos pais é acarinhar os filhos, dar-lhes uma educação e fazer-lhes sentir que têm uma família onde podem crescer e construir o seu futuro. não entendo a família como um pai para ensinar os filhos a ir à bola e a gostar de raparigas, e uma mãe para ensinar às filhas como se usa uma saia e como se aprende a gostar de rapazes. acho que é aqui que reside a confusão de muitos os que acham que se deve negar a adopção a casais homossexuais. efectivamente, eles não vão "contaminar" os filhos. parece-me tão simples a ideia de que se existe um casal com vontade de ter filhos então deixem-nos adoptar. não entendo as barreiras que se tentam colocar.
p.s - como te parece a ti estranho a questão da raça, a mim parece estranho a questão da opção sexual. tal como para mim um negro e um branco são a mesma coisa no que toca a paternidade, também um homossexual o é.

Manuel Marques Pinto de Rezende disse...

infelizmente, não me parece que democracia tenha inexoravelmente ligada o principio de igualdade para todos.
a mim parece que democracia tem inexoravelmente ligado a si o principio da soberania popular, e assim da vontade da maioria de sufrágio. e isso nem sempre se transparece numa total igualdade para todos. já falava Kant numa "Democracia repressiva" ou na "maioria opressiva".

os valores de igualdade de todos, de submissão geral à lei, parecem-me exclusivos do Estado de Direito, mais concretamente do Estado de Direito Democrático, pois alia os dois principios anteriormente referidos.
Daí, não acho obrigatório um estado democrático obedecer ao principio da liberdade de casamento de homosexuais. Porque já os houve e os há que não permitem. É uma questão sociológica, dependente da evolução de mentalidades de um povo, e não pode ser imposta arbitrariamente por uma autoridade iluminada.
A própria comparação ao facto de os negros poderem adoptar crianças e os homosexuais não é incorrecta. Estão em jogo duas perspectivas, uma biológica e outra que não o é, tal como foi referido pela daniela, é uma opção sexual.
O cerne da questão está em invalidar ou não o factor de adopção pela opção dessa posição. A diferença da educação de um casal homosexual e um casal heterosexual é um fundamento válido para a escolha do Estado em qual é o grupo mais apropriado para o Estado confiar os seus órfãos?
Eu digo simplesmente que a intervenção do Estado não chega até tão longe.
A liberdade consiste na total aceitação por parte dos individuos dos efeitos e consequencias das suas acções. E perda de direitos fundamentais como a constituição de família não é uma consequência passível de desprezo pelos orgãos institucionais.
Assim, por muito que a educação difira no que toca à opção sexual dos pais, esse facto não pode ser passível de supervisão estadual, excepto em caso de claras violações de direitos da criança.

Francisco disse...

Manel,

creio que podes hastear a bandeira do primeiro homem a dizer que Democracia não implica necessariamente o princípio da liberdade. Parabéns! Ou então teremos conceitos de democracia bastante distintos. Aliás, já é costume: temos sempre conceitos muito distintos de ideias fundamentais. Vá-se lá saber porquê.

" E perda de direitos fundamentais como a constituição de família não é uma consequência passível de desprezo pelos orgãos institucionais".
Deves ter um conceito de "família"
semelhante ao do Bento XVI.

Isto realmente é desolador. Ainda há quem seja capaz de discutir o direito de qualquer um a casar com quem bem lhe apetecer.
Ai. Ai.

Francisco disse...

Errata: princípio da IGUALDADE e não liberdade.

Ai. Ai.

Manuel Marques Pinto de Rezende disse...

digo, e volto a dizer. a igualdade de tdos perante a lei é uma questão de Direito, pois é este que regula o estado Democrático.
A democracia existe há muito tempo, o principio da igualdade é algo evolutivo, que nem sempre foi considerado da mesma forma.
daí a ter o orgulho a arvorar que democracia por si só não quer dizer, necessariamente, direitos iguais para todos. há uma democracia no Iraque que não respeita o principio da Igualdade pela ausência de um Estado de Direito igualitário e livre, daí todas as represálias sofridas pelos sunitas actualmente. isto só a título de exemplo.

mas sem desviar do assunto: o meu ver da família secalhar é, tal com dizes, semelhante ao do Papa Bento XVI. pelo menos será, se ele vê a família como um dos fundamentos da sociedade e um dos fundamentos da liberdade individual, e se ele vê que a protecção da família é um passo para a formação livre e saudável dos indivíduos. porque família não é apenas palavreado salazarista, mesmo num país dominado pelo medo do "fássismo".
e um casamento é um pouco mais do que um simples contrato ou um simples negócio jurídico que se faça sem noção de responsabilidade.

e também não sei quem, nestes últimos comentários, supôs a impossibilidade de "qualquer um a casar com quem quiser"... acho que aí apenas não leste bem, ou não quiseste aceitar a discussão de premissas lançadas por ti, mas isto serão indagações minhas.

Ui. Ui

Anónimo disse...

Francisco,

o meu argumento não leva às tuas conclusões. Poderia levar, sem dúvida, mas não leva, porque não foi em tal sentido que o trouxe. As crianças entregues ao Estado deverão, por sua vez, ser entregues a famílias de acordo com um conjunto de critérios e opções que o próprio Estado considera como adequados. A democracia está num momento anterior: naquele em que se legitimam assembleias populares pela eleição, em que cada membro da comunidade tem o mesmo voto. E isto também é uma opção política, sem dúvida. É uma opção política dar voto às mulheres, acabar com o voto censitário, que dentro do mesmo Estado valha tanto o rico o pobre e o vagabundo. Agora, numa democracia esta opção política tem de estar tomada.

O caso da adopção por homossexuais é diferente. Podemos falar de uma "democracia social" (e já será falar em democracia em sentido muito impróprio). Inclino-me a pensar que mais não é que uma opção política, não pretendendo com isto afastar a pertinência do problema. Simplesmente, ele só será solucionado se houver algum consenso social em "mudar as coisas", consenso esse que, a existir, será vertido em direito positivo. Juridicamente, é tão defensável a proibição da adopção por homossexuais como o inverso: são espaços em que o Direito só enforma a realidade, só dá veste a opções prévias.