quarta-feira, 25 de junho de 2008

this title is not written in latin.

Há certos pressupostos na forma de agir de um governo que o torna facilmente descritível aos olhos de um analista, aos olhos de um historiador, de um político. É impossível distanciar a ideia de Força, não no sentido de violência ou Coerção, mas sim Força no sentido de perseverança e insistência, da estabilidade necessária à governação de um País. Há muito que o actual governo deixou de possuir condições necessárias para continuar a sua governação, e deve-se apenas ao carácter ingénuo e profundamente volátil da nossa democracia que tal governo se mantém. Desde o caso dos arrombos ao Estado de Direito durante a greve dos camionistas, até à cedência às suas exigências, que vai fazer com que o exemplo daí retirado seja, daqui em diante, perpetrado e imitado, o Governo tem permitido que a sua autoridade enquanto Executivo eleito democraticamente se desvaneça no nevoeiro. Os membros do Governo, além de uma enorme falta de bom senso, exprimem também uma falta de tacto e de respeito quando se trata de se dirigir aos cidadãos para falar da "coisa pública". Tudo ocorre num ambiente de café, e o que um ministro diz num dia é prontamente desmentido no dia seguinte, ainda que sem qualquer tipo de relevância para que o faça ou não, visto que não devia ter dito o que disse no dia anterior de qualquer forma. Por exemplo, a ideia do Ministro Mário Lino de chamar deserto à margem sul do Tejo, um óbvio erro de bom-senso que será memorizado nas lições de como agir ou não em política, durante os anos vindouros (esperemos). Por muito que se possa ser acusado de picuinhas, as pessoas não gostam que apelidem de "deserto" à região onde vivem, a não ser que esta realmente o seja.
Esta pequena-algo-extensa nota introdutória prende-se com as últimas declarações do Ministro da Agricultura Jaime Silva, que terá alegadamente chamado de extremistas de esquerda e direita aos dirigentes da CAP, Confederação de Agricultores Portugueses. Obviamente, como era de esperar, retratou-se desta afirmação.
O que vale a pena analisar aqui é até que ponto esta situação não será verídica, e que o tal Ministro se deveria ter poupado aos retratamentos.
De facto, os regimes que pior fizeram à agricultura (e economia) portuguesa foram, respectivamente, um regime de direita conservador e um regime de extrema-esquerda. O primeiro, o de António Salazar, perpetrou nas regiões aráveis portuguesas graves crimes que talvez nunca serão recuperáveis. De facto, o Estado Novo incrementou planos tendo em vista a famosa autarcia, na produção de matérias-primas em Portugal, entre eles a Campanha do Trigo. A ideia era usar o então ainda fértil Alentejo para a exploração extensiva de Cereais. Baseava-se este plano num pressuposto histórico (como tantas outras coisas no Estado Novo). Este pressuposto era o de que Portugal fora, em tempos, capaz de produzir trigo suficiente para consumo próprio. O que os Salazaristas não sabiam, porém, é que esses tempos datavam de 1215, durante o reinado do único soberano que conseguiu tornar Portugal um produtor de cereais com sucesso, El-Rei Dom Dinis, que contava então com o governo de uma pequena Nação Ibérica com pouco mais de um milhão de habitantes, ou seja, havia um mercado relativamente mais fácil de saciar quando comparado ao actual. Por volta de 1940-50, Portugal já tinha há muito perdido a sua tradição cerealífera, e dependia dos cereais dos outros países, especialmente Norte de África e Norte da Europa. O resultado foi o da óbvia exaustão das terras do Alentejo, que quedam até hoje num lento processo de desertificação devido ao excesso de esforço exigido à Terra. Escusado será dizer que a Campanha do Trigo no Alentejo teve alguma rentabilidade durante 2 ou 3 anos, que foi rapidamente esbanjada nos esforços do Estado Novo para encobrir o enorme falhanço. Encontrava-se pois neste estado de letargia a agricultura nacional quando, após os esforços com pequeno êxito do IIº e IIIº Plano de Fomento da época Marcelista, se dá o 25 de Abril e se procede às nacionalizações, expropriações e se formam as "copratibas". Estas cooperativas, apesar de despidas de quadros técnicos responsáveis, e equipadas com tecnologia fornecida pelo Estado da altura do PREC absolutamente obsoleto (vieram tractores de União Soviética), mantiveram-se e à sua produção deficiente durante quase dois anos, altura em que começaram as chamadas "reprivatizações", feitas à revelia do erário público gasto nas originais nacionalizações e à revelia de quem deveria ter sido chamado a prestar contas por as ter feito.
Manteve-se no entanto na agricultura portuguesa, após as influências "malévolas" dos regimes extremistas, a inoperatividade, a preguiça, a falta de inovação. E o Problema é demasiado simples: Portugal tem demasiada agricultura. Ainda temos uma agricultura ineficiente e desastrada, porque não a temos bem planeada, porque não há espaço para investimentos da iniciativa privada (essa malandra, que vai destruir a agricultura se o Alentejo não for "nosso outra vez") em Portugal, porque a agricultura é feita quase como se fosse um hobby obrigatoriamente remunerado pelo Estado, ainda que não dê nenhuma rentabilidade produtiva.
Tal e qual como no Estado Novo, só que no Estado Novo interessava manter este marasmo económico, pois esse marasmo económico, esse desinteresse do sector pelo comércio competitivo, fomentava a que houvesse um igual marasmo educativo, intelectual, etc. Agora, não há grande desculpa para tal se manter.
De facto, há vários factores para a economia portuguesa não ser rentável. O mais importante é o facto de o País não ser feito para a agricultura, como está provado que mais de 60% dos solos são apropriados apenas para exploração florestal. Apenas 40% deles são usados, no entanto, para esse efeito, se não menos.
Outro facto é o de a especialização da agricultura ainda não ter vindo, e porque se insiste na produção massiva sem atentar ao único grande trunfo que um pequeno produtor pode apresentar para contrabalançar com um grande produtor: a qualidade do produto.
Os contínuos subsídios governamentais não apoiam os produtores do produto subsidiado, ao contrário do que possa parecer. Antes atraem para a produção desse mesmo produto uma quantidade de novos produtores que, de forma a aplicar as suas propriedades, sacrificam o que antes produziam. O óbvio resultado é a saturação do mercado. Não se compreende que um país com um número muito grande de uma árvore cada vez mais rara, o sobreiro, veja o seu Estado a promover o abate em massa desta mesma árvore ao conceder um subsídio aos produtores para produzirem outras coisas.
O grande problema na Agricultura não é o abandono do Estado, é o Estado em si. São os próprios agriultores, que perderam todo o sentido do que é viver da agricultura. Continua-se a gastar muito neste sector, sem que se produza algo de qualidade e que seja competitivo no mercado, sem que daí nasçam novos empregos e se formem focos de inovação e investigação.
O grande problema da Agricultura não é a presença da intervenção do Estado. É sim a sua asfixiante "caridade", que lhe impede de providenciar directrizes que a Agricultura possa seguir e por aí encontrar o seu rumo. Essas "directrizes" tratam-se de convencionar quais os produtos que, pela sua tradicional implantação e ligação ao nosso folclore agrícola, bem como a sua adaptabilidade aos terrenos, devem ser estimulados de forma a serem produzidos. Antes de mais, o Estado devia assegurar a protecção desses mesmos produtos agrícolas que caracterizam a nossa agricultura, como a azinheira, a vinha, o sobreiro e a sua cortiça, etc.
Manter o actual marasmo corporativista, o actual ram-ram de subsídios e apoios inconstantes, manter o escandaloso condicionalismo de Estado neste sector só vai acentuar as falhar da nossa agricultura: fraca mecanização, larga despesa, parcelamento ineficaz, pequena significância da produção biológica.
Os únicos grandes avanços das zonas rurais são dadas por iniciativas de pessoas colectivas privadas. Procura-se revitalizar as antigas "aldeias históricas" e trazer à luz da modernidade os antigos tempos da "Aldeia Velha", de forma a tornar estes focos de história do nosso povo em pontos turísticos e de investigação. Em todas estas acções é necessária uma clara cooperação entre Estado-sector privado.
A única forma da Agricultura não precisar de tanto para retribuir tão pouco, falando da Agricultura Continental, porque as ilhas mantém produções agrícolas bem direccionadas e bem pensadas, é confiná-la às suas verdadeiras proporções.

3 comentários:

D. disse...

existem vários pontos no teu texto. talvez não os vá comentar por ordem nem a todos como queria.
primeiro, quando falas da questão do abate dos sobreiros. tanto quanto se tem vindo a saber, eles são abatidos não para produções agrícolas, mas sim para construções de campos de golfes e resorts de luxo que não são para a maioria dos portugueses, ao contrário da agricultura que iria beneficiar a todos. não acho portanto que aqui a culpa seja da agricultura, é sim do Estado, ou dos titulares do poder político que vão autorizando obras que nunca racionalmente e legalmente seriam autorizadas, mas como eles serão dos poucos portugueses que alguma vez irão ter proveito de tais obras, faz sentido que as apoiem.
quanto à questão dos terrenos. se atravessares a fronteira pelo alentejo ou pelo algarve de carro, cedo verás que o facto de estar em solo espanhol com um clima exactamente igual, consegues ver longas explorações agrícolas que muito ao contrário das portuguesas são modernas e altamente produtivas. ora, não me parece que a culpa seja do estado, mas sim do facto de que se eu comprar uma quinta no alentejo, ganho bem mais em usar o subsidio para a agricultura investindo numas boas férias do que propriamente na produção, até porque posso sempre culpar o solo ou a seca ou a chuva. talvez o estado falhe na fiscalização, concordo. mas se os portugueses acham que o estado já intervém tanto, porque lhes custa tanto aplicar os subsídios para aquilo que eles servem? porque não tentar corrigir a mentalidade portuguesa de nunca fazer nada de forma honesta?
e é dessa incapacidade tão portuguesinha de querer sempre arranjar um subsidio que nunca é efectivamente aplicado, que hoje em dia muitas herdades alentejanas estão a ser ocupadas por imigrantes que resolveram aproveitar os subsídios para efectivamente produzirem. e assim vão nascendo discrepâncias entre os agricultores portugueses que ostentam a sua vida miserável e aqueles que aproveitando os subsídios e recursos naturais adoptam as colheitas ao clima.
P. S - a cada dia que passa mais me convenço de que portugal apenas poderá vir a mudar quando não for habitado por portugueses xD

Manuel Marques Pinto de Rezende disse...

o problema não está só na agricultura, mas sim no facto de estar ser demasiado protegida e favorecida. o abate de sobreiros não é minimamente justifucável daniela, nem para fazer campos de mini-golf, nem para fazer plantações de bananas. pela simples razão que a cortiça é um indústria na qual nós somos, pecado de todos os pecados, competitivos!
quanto ao uso dos terrenos, também não vai no sentido contrário ao meu texto o que tu dizes. o que há em Espanha é a disponibilização de serviços vitais para a gricultura, apoiados pelo Estado, e empresários agrícolas que daí tiram os seus lucros e rendimentos. e não compares o espaço que os espanhóis têm disponivel para a produção de produtos agricolas com o nosso :P

por muito que nós produzamos todo o tipo de bens, nunca o conseguiremos fazer de forma competitiva. a unica hipotese da agricultura é especializar-se, e principalmente especializar-se naqueles bens que sempre produziu quase a título exclusivo.

D. disse...

não te falava em termos de quantidade , mas de possibilidade.