Já lá vai um longo período de tempo em que este blogue se tornou extremamente focado na questão da homossexualidade... agora somos abordados pela perspectiva ou melhor dualidade família-casamento. Em boa hora, tomámos defesa perante esta clara e óbvia discriminação... abstenho de entrar numa óptica subjectiva, mas a questão é simples:
* Enquanto alunos de direito, que professam tal, ou possuem os primeiros contactos face a essa mesma realidade (?) é natural insurgirmo-nos contra qualquer limitação à liberdade e ao livre desenvolvimento da pessoa humana, estabelecer "natura" ou “contra-natura” na questão é perfeitamente néscio, sensacionalista levado ao extremo e uma visão "bloqueada" pela tal já falada perspectiva histórica...
* Defende-se a história, mas numa perspectiva sempre pessoal, pois é subjectivo descrever ou não numa linha temporal o que é correcto ou não, é subjectivo quando falamos porventura em certo costume, é um hábito... agora, é correcta? Penso que as pessoas fixam-se demasiado naquilo que julgam como correcto, e a partir daí não aceitam qualquer influência, visto ter adoptado certo (tal) costume...
* Apresentar a instituição "casamento" como algo que ontologicamente se liga a casais de sexo diferente é absolutamente incorrecto na sociedade hodierna, já vários argumentos foram levantados contra essa mesma perspectiva e, acima de tudo se se tiver ciente principio ordenadores gerais do ser humano (campo sempre abstracto e de difícil definição)por lógica se chega à correcção (dessa mesma perspectiva).
* No fundo, o facto de se proibirem os casamentos mediante a lei portuguesa será algo profundamente inconstitucional, sim! Visto que os DLG se submetem aos princípios gerais ordenadores do ser humano sempre influenciados por uma qualquer transcendência moral. Agora nesta perspectiva, será constitucional ou não mediante a perspectiva moral que cada um de nós associa a tais princípios... mas se for possível averiguar uma tal ordem Moral que consiga bloquear influências irracionais próprias do ser humano (como o tal costume dos "casais de sexo diferente", ou porventura a sempre irracional Religião) é natural ou apresenta-se como tal que todos nós tenhamos uma visão clara desse mesmo problema (? - sim porque só se tornou problema devido a essa constante influência subjectiva em algo que deveria ser apenas e só Objectivo e não conspurcado por irracionalidades).
* O casamento é um DLG - art.36º, aparentemente então a sua proibição não é inconstitucional e tudo o que disse não se aplica, pois se de facto ele é DLG e não são permitidos casamentos homossexuais então simplesmente está submetido a uma ordem Moral que prevê tal... Mas como sempre os DLG submetem-se a valores ainda mais transcendentes... digamos que no fundo se ao longo dos tempos o tal costume desaparece na sociedade então a ordem moral que o acompanhava altera-se, sendo assim a CRP (aliás CC, visto que a proibição nem será tão explicita na Lei fundamental) tem que acompanhar essa mesma alteração. Resolve-se assim qualquer contra-argumento face a "tão frágil devaneio" meu em submeter a questão a princípios ordenadores do ser humano.
* Última questão, fala-se da tarefa do estado: natalidade, etc. É grave que se procure justificar um tal “contrato” entre pessoas pela sua possibilidade de constituir família e procriar ou não; aliás, a frase que se utiliza ao falar dos casais inférteis e de uma profunda falta de bom senso como nos vem dizer o ASL: “(i) as políticas de família a seguir pelo Estado devem ser aquelas que promovam o aumento da natalidade, logo, todos os descontos e benesses que existem de acordo com um maior número de filhos não se pode enquadrar, como me parece óbvio, nem nos casais homossexuais, nem, como agora lembraste, nos casais inférteis! Parece-me lógico...” – parece-me lógico, em que racionalidade te baseias, em algum pensamento falacioso porventura, visto que como é que o Estado iria agora ou não financiar famílias/casamentos mediante uma tal distinção “inconstitucional” de férteis ou inférteis? Isso é grave mesmo, aliás não sei se tens ciente o próprio direito à informação pessoal e não a sua divulgação, procura nos DLG…. Grave repito, friso, sublinho, e demonstras uma grande falta de bom-senso mesmo (nem sabes quantas vezes tive que ler aquela mesma frase – clarificando-a e comentando-a de perfeita estupidificação “racionalizada”).
* Discutir a homossexualidade – casamento, família só têm uma meta, qualquer hesitação, qualquer defesa contra esse direito será sempre profundamente irracional…. Aliás, de facto se não fossemos tão influenciáveis e se soubéssemos escolher bem o “trigo” que temos que colher sempre que falamos com alguém então porventura nem tão longa teria sido esta mesma discussão… Juridicamente, inconstitucional tal proibição! Simples, e mesmo que não fosse inconstitucional formalmente seria porventura, ou melhor COM CERTEZA inconstitucional face à nossa Constituição Material. Mas, o “melhor” desta “discussão” é que nem pelo campo do Direito proprio sensu temos que entrar, simplesmente basta usar a filosofia inerente a nós mesmos ou um qualquer grito a favor da pura liberdade (pura não extrema, antes que seja crucificado pelo meu idealismo). Não sei ao certo se fui capaz de atacar argumentativamente o que se discute em si (ou se repeti meramente o que muitos já disseram), mas distinguir um casamento civil ou um qualquer outro conceito para casais homossexuais também seria outra discriminação. Acho isto tão óbvio, que acaba por ser uma perda de tempo….
7 comentários:
A única parte em que não concordo contigo é a da perda de tempo. À primeira vista pode parecer que sim, mas esta também é uma forma de agir.
De resto, como alguém disse aqui à pouco tempo, as discussões servem para ambas as partes persuadirem e serem persuadidas.
Quando falas em "estupidificação racionalizada" eu falaria em racionalização apenas. ASL tenta, a todo o custo, racionalizar o seu preconceito.
Admito que também eu já o fiz, ainda que em relação a outros assuntos (e são tantos!), e que, por isso, não me sinto em posição de o censurar.
Diria que este pode ser encarado como um comentário subjectivo e acredito que o silêncio depois da conversa é tão necessário a conversa em sim por isso também não insisto mais e pode ser que um dia destes fiquemos a saber que o ASL mudou de opinião ou que pelo menos tentou encarar a questão do nosso ponto de vista.
"Visto que os DLG se submetem aos princípios gerais ordenadores do ser humano sempre influenciados por uma qualquer transcendência moral. Agora nesta perspectiva, será constitucional ou não mediante a perspectiva moral que cada um de nós associa a tais princípios... mas se for possível averiguar uma tal ordem Moral que consiga bloquear influências irracionais próprias do ser humano"
Henrique, desde já esclareço que sou a favor do casamento entre homessexuais. Mas não posso deixar de discordar vivamente deste teu pedaço de texto. Os DLG submetem-se aos princípios gerais ordenadores de cada ser humano? O que é isto? então cada um de nós é um ordenamento jurídico com a sua própria constituição e a sua vontade! Então eu faço o que quero da minha vida porque no Meu Direito tudo é possível! A constitucionalidade ou não do casamento entre homossexuais afere-se de outro modo: confronta-se essa proibição de casamento com o quadro axiológico comunitário, com os princípios que informam e enformam a realidade. E um deles é o da igualdade. A inconstitucionalidade não se funda em qualquer confronto da Minha opinião com a Tua vontade. Encontra-se, aí, sim, numa desconformidade da proibição com os princípios fundamentais e um ordenamento assente na dignidade da pessoa humana, no livre desenvolvimento da personalidade, em que qualquer situação materialmente igual deve ser tratada de forma igual.
Tiago,
Já estava a espera de uma qualquer "reacção" face à expressão " princípios gerais ordenadores do Ser Humano”, assim irei tentar ser sucinto e explicar o que entendo por tal:
* O povo, sociedade (...) como se definem os princípios integrados no ordenamento jurídico geral que o influenciam? Quem conhece a tal vontade? Somos considerados enquanto um Todo e não individualmente (não procuro rejeitar tal concepção) mas neste caso concreto falamos da existência de uma certa tradição na inexistência de casamentos homossexuais, isto é, mesmo infringindo a CRP os casamentos são teoricamente proibidos, certo? Até aqui todos concordamos, agora se tal tradição existe é porque se pensa que certa ordem Moral ainda existente materialmente na sociedade a favorece, assim é natural que por maioria a "favor" dessa mesma tradição tal casamento continue a ser proibido, mesmo que exista certa minoria que o aceite (claramente à luz de princípios diferentes, princípios esses morais, ou seja uma qualquer outra ordem Moral, diferente da "Colectividade", assim surge o MEU e o TEU, as duas ordens morais intrínsecas a cada).
* Pode-se desenvolver qualquer princípio da Constituição à luz da eterna procura daquilo que são definitivamente os princípios gerais ordenadores (fundamento ontológico do direito na perspectiva filosófica), mas lá está, cai-se num erro falacioso, pois não se consegue definir concretamente algo que em si é puramente abstracto, e como ninguém detém uma verdade absoluta em si, então acabamos por negar qualquer capacidade interpretativa da ordem moral existente na sociedade ou no TODO que todos postulamos, certo?
* Não veres isto como a perspectiva subjectiva de cada um que postula, uma ordem Moral diferente perante a mesma circunstância, seria aceitar (como que se tratasse de uma reviravolta - ? – pois aqui subjectivo não conduz a diversidade de ordenamentos jurídicos) que a Ordem Moral UNA fosse de facto algo fragmentado, e a ser fragmentado, não nos podíamos opor a quem diz que a partir da Lei Fundamental os casamentos homossexuais devem assumir outro cariz etc. É que, e de uma maneira geral, o Meu e o Teu formam um TODO não numa soma apenas das duas perspectivas mas sim numa interligação quase que metajurídica em si (quase? alias de certeza que metajurídica).
* E esta ligação metajurídica é meramente um ideal? Sim, certamente e só neste campo podes aceitar exactamente o que escrevi… mas o teu “erro” nem foi tanto criticar a minha definição abstracta (pois tem que ser) dos princípios ordenadores e das duas ordens Morais que permitem a existência de várias interpretações (mas lá está duas? Porque duas distintas, se somos o TODO?); o teu erro em si, foi falar da possibilidade do Meu direito e do Teu direito, pois de facto aqui entras não só por algo que nunca disse nem se poderia aferir das minhas palavras, pois Direito será sempre um, alienado de perspectivas subjectivas que o fragmentassem ou formassem simplesmente um todo ambíguo (a nível de perspectivas-posições, entendes?), Direito será sempre só um! A questão da homossexualidade à luz do que escrevi refere-se exactamente ao que vens defender de seguida, os postulados axiológicos da comunidade, lógico, eu defendo isso, afinal de contas o que será uma Ordem Moral (numa definição lata)? Repara que os valores da sociedade se reflectem directamente no direito e voltamos ao início à tradição subjacente ao Direito, à ordem jurídica, essa mesma tradição é que pode ser dupla (friso isto), no campo do MEU e TEU, percebes? Essa mesma tradição será uma outra qualquer interpretação, neste caso concreto da homossexualidade, profundamente irracional (devido aos bloqueios porventura religiosos como referi etc.). ou racional no âmbito de quem defende esse mesmo casamento (na minha perspectiva subjectiva, antes que me critiquem pelo uso das expressões racional ou irracional…
* Em suma, e porventura, por estarmos a entrar num campo pouco concreto e somente abstracto (filosofia- Direito: Ordem Moral latu sensu que influencia o direito na óptica subjectiva existe sim, uma, duas, mil… existe é um facto, é por isso que à luz das mesmas disposições uns lêem certa coisa e outros outra, certo? Agora, Direito apenas um….
* No fundo, penso que analisaste o que eu disse no campo da “vontade” apenas, da distinção disso mesmo, mas é que à luz do ordenamento jurídico em si, esta questão do casamento homossexual nem se deveria pôr, pois materialmente ela deve existir na sociedade hodierna como temos vindo a defender sistematicamente (daí eu ter utilizado a expressão “perda de tempo” ANA, pois penso que é algo que está “garantido” na teoria, falta apenas a prática…. Que é o maior dos passos….).
Abraço!
Henrique,
Naquilo que me diz directamente respeito: nunca justifiquei “um tal “contrato” entre pessoas pela sua possibilidade de constituir família e procriar ou não.” A única coisa que tenho a dizer em relação ao seu post é uma repetição do que aqui já escrevi:
“Há duas coisas diferentes:
- Apoio do Estado à natalidade
- Promoção/ Reconhecimento de certos contratos como casamento por parte do Estado
Aquilo que fizeste foi misturar as duas coisas: dizer que defendo que o Estado deve reconhecer como casamento as uniões entre pessoas que podem vir a aumentar a natalidade. Não foi isso que disse.
Defendo que:
(i) as políticas de família a seguir pelo Estado devem ser aquelas que promovam o aumento da natalidade, logo, todos os descontos e benesses que existem de acordo com um maior número de filhos não se pode enquadrar, como me parece óbvio, nem nos casais homossexuais, nem, como agora lembraste, nos casais inférteis! Parece-me lógico...”
E acrescento, redundantemente, que daqui não se pode concluir que sou contra a existência desse tipo de contratos entre pessoas do mesmo sexo com o nome de casamento porque os mesmos inviabilizam a procriação!
Henrique, cá vai a minha resposta. Desde já digo aquilo em que concordo contigo. Direito vigente só há um, plenamente de acordo. Não concordo é com o restante. Responderei por números, consoante os astericos (para facilitar a resposta).
1. Os casamentos entre homessexuais são proibidos porque há uma contradição lógica entre a lei e a Constituição. Não serve de nada trazermos para o assunto a ordem moral. A Constituição consagra o princípio da igualdade e não se justifica que dois homossexuais, por o serem, não possam contratar ficar juntos por tempo indeterminado. Simplesmente, os responsáveis pela feitura das leis, por quaisquer motivos (que creio serem morais) ainda não ajustaram a Lei à Constituição, mantendo esta inconstitucionalidade.
2. "pois não se consegue definir concretamente algo que em si é puramente abstracto" Não percebo a valia da afirmação. Consegues definir algo que é concreto? O que é uma cadeira? O que é uma mesa? Há dificuldades em definir qualquer objecto - físico ou metafísico - mas é por isso que temos linguagem, para nos permitir criar conceitos operativos. Se concordasse contigo, jamais poderia aceitar a defenição de direito. O que é um direito subjectivo? É algo de puramente abstracto. Mas s enão o definires pões em causa todo o sistema jurídico.
3. O Direito entrecruza-se com a Moral, não se identifica com a mesma. E há concepções morais e éticas que não são metajurídicas. São jurídicas. Olha a dignidade da pessoa humana. O casamento entre homessexuais a ser proibido será com base numa moral que, a meu ver, não merece acolhimento no Direito. Porquê? Porque é corolário fundamental do princípio da igualdade - jurídico E ético - tratar igual o que é igual. No casamento são dois seres humanos.
4. Não consigo perceber como é que uma tradição relativa a um Direito pode ser dupla.
5. Não serve de nada dizer que uma lei tem várias interpretações para justificar várias posições como certa. A ordem jurídica está concebida de modo a garantir que todas as concretas situações iguais têm de ser tratadas de igual forma. Se perante a mesma situação há duas soluções, uma tem de estar mais próxima da adequada. E o enfoque desta discussao deve ser colocado aí: não está certo proibir os casamentos entre homossexuais porque são situações materialmente iguais às dos casamentos entre heterossexuais.
6. Concordo.
Abraço. E ansioso pelas objecções...:P
Nota: não serve de nada trazer a ordem moral porque o quadro axiológico comunitário já reconhece o princípio da igualdade. Por isso é que no mesmo me centro.
Henrique:
Eu percebi o sentido da expressão, mas de facto não concordo. Ou concordo, já não sei.
O que queria dizer é que a prática também passa por este tipo de discussões/intervenções, quando construtivas, visto que nos ajudam a clarificar ideias, reunir mais e melhores argumentos e que exactamente por parecer garantido, mas não ser, não deverias considerar a tua participação ou a de qualquer outro uma perda de tempo, mas desculpa se te interpretei de facto erradamente.
ASL:
Se não és "contra a existência desse tipo de contratos entre pessoas do mesmo sexo com o nome de casamento porque os mesmos inviabilizam a procriação", então porque é que és contra, afinal? Por causa do elemento histórico, apenas? É que esse elemento tem o peso que tem. Lembra-te que antigamente a escravidão era considerada normal, até que deixou de ser. Antigamente, era normal as mulheres não poderem votar, até que deixou de ser.
(Vou parar porque isto já me está a fazer lembrar um anúncio publicitário qualquer muito rasca e já esclareci o meu ponto de vista)
Fiquem bem, boas férias para todos!
Enviar um comentário